o que vai ser da gente que escreve?
reflexões sobre IA e o papel da nossa humanidade na escrita
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senta que lá vem textão. eu não queria ser mais uma pessoa falando sobre tecnologia e arte nessa internet, porém, cá estou. pra mim, tem sido inevitável pensar no futuro, a minha cabeça Hello Kitty não para, e mapear milhares de cenários catastróficos com quatro anos de antecedência, tal qual a Ansiedade de ‘Divertidamente 2’, virou meu traço tóxico.
(inclusive, você já assistiu? chorei horrores, nota 10.)
curiosamente (ou seria Lei da Atração?), começou a pipocar pra mim uma série de textos que refletiam sobre a onda inteligência artificial e o que vai sobrar da humanidade depois que ela quebrar na orla.
honestamente, eu não tenho uma resposta.
e talvez você tenha visto (talvez não) essa frase rodando a internet:
eu quero que a IA lave as minhas roupas e louça para que eu possa fazer arte e escrever, não que a IA faça a minha arte e escreva por mim pra que eu possa lavar as roupas e a louça. - Joanna Maciejewska
eu fiquei DIAS pensando sobre isso, porque é exatamente o eu penso. eu não quero que a inteligência artificial e a tecnologia tomem o espaço da arte que me faz me feliz, mas das tarefas cotidianas que me roubam um tempo precioso.
como uma mulher (atualmente) solteira, sem filhos e que mora sozinha em outro país, eu posso dizer com propriedade que gasto um tempo insano com as tarefas cotidianas. é o famoso ‘poderia estar escrevendo, mas tô aqui limpando banheiro’.
e, veja bem, eu não tenho absolutamente nada contra casa limpa e arrumada (inclusive amo e fazer faxina tem um quê de terapêutico). mas uma coisa é fazer esse tipo de atividade por escolha, outra é por obrigação.
agora, pensa que essa sou eu, uma pessoa extremamente privilegiada falando sobre o assunto. imagine o caso de mulheres que, além de trabalhar, precisam cuidar da casa, cozinhar e criar os filhos. a carga mental é gigantesca.
e, aí, a gente vê casos de softwares de fotografias famosíssimos, redes sociais e absolutamente tudo no mundo incluindo IA nas suas plataformas pra fazer algo que é intrinsecamente humano: criar.
dizem os apocalípticos da internet que logo, logo vai ter mais robô criando conteúdo do que ser humano, e que continuar como uma pessoa criadora de conteúdo vai ser cringe. se essa verdade vai se concretizar ou não, eu não sei, mas que parece bem possível… parece.
um caso de amor com a humanidade
dentre tudo o que eu li sobre o assunto, fica martelando na minha cabeça também esse texto do Ted Goia, em que ele basicamente explica que a arte vai deixar de ser importante em nome de um novo peixão nesse oceano chamado internet: a distração.
não é difícil perceber que isso já tá acontecendo, né? a nossa capacidade de reter atenção tá cada vez menor (literalmente menor que a de um peixinho dourado, com os seus 8 segundos de memória) e a gente tá priorizando tempo de tela ao invés de conversas profundas e aprendizado. a rapidez das redes parece melhor que a velocidade natural das coisas e antes uma resposta rápida do que um estudo aprofundado.
pior do que isso é o peixão ainda maior que vem logo atrás da distração, o vício, que tá, de fato, mantendo a gente nesse ciclo.
o que a gente vai dizer sobre a inteligência humana no futuro?
não sei.
mas, nisso, eu lembro do maravilhoso Ethan Hawke, e como ele disse o seguinte:
ninguém passa muito tempo pensando em poesia. as pessoas têm vidas pra viver e não estão muito conectadas com poemas, até que seus pais morrem, eles vão a um enterro, perdem um filho, alguém parte o seu coração, eles não te amam mais. e, de repente, você está desesperado pra fazer sentido de tudo isso.
e aí a poesia faz sentido. a música tem uma razão de existir. a escrita, a dança, a fotografia… tudo isso parece tornar compreensível a nossa experiência humana. seja diante de sentimentos ruins ou de emoções incrivelmente boas. e é possível que a arte nunca deixe de existir (eu espero), porque os sentimentos humanos vão continuar ali, quer a gente esteja ciente deles ou não.
a gente vai ter que aprender a lidar com eles, mais cedo ou mais tarde.
o que me assusta é essa inversão de valores. e como a gente tá permitindo que as tarefas intrinsecamente humanas sejam, de fato, executadas por máquinas. eu consigo identificar um texto escrito por IA bem rápido, e na hora me dá uma preguiça danada de continuar lendo.
como resultado, tô me espaldando em pessoas, buscando onde eu posso, de fato, me conectar com outros seres humanos como eu. e como a gente pode compartilhar e trocar e crescer juntos, sabe?
(é por isso que o Substack tá virando o meu lugar favorito da internet.)
por outro lado…
um ponto que bateu na porta da minha mente é que quem faz a tecnologia são os humanos. e tal qual dizem todas as mães mundo afora “você não é todo mundo” e, de fato, não precisa usar a tecnologia como “todo mundo” tá usando.
mas transformar essas ferramentas em algo que faça sentido pra você.
eu falei sobre carga mental uns parágrafos acima, e, recentemente, li esse texto que explica como o chatGPT pode ajudar com isso. foi engraçado, porque enquanto eu lia percebi que “nunca tinha pensado dessa forma!!!!!!!” e que poderia contar com essa tecnologia pra, no mínimo, me ajudar a liberar espaço mental sobre alguns assuntos que ocupam demais a minha cabeça. exemplo:
pedi pra ele montar uma lista com 20 filmes conforto disponíveis na Netflix pra eu ter à mão quando quiser ver um filme sem pensar muito no assunto.
também falei pra ele montar a minha lista de compras com base na minha alimentação semanal e ainda listar 5 receitas diferentes pra café da manhã e almoço, pra eu variar o que eu como.
tenho um projeto pessoal rolando e pedi pra ele me ajudar a pensar em cada etapa e tarefa que eu preciso cumprir até a data limite (ele me deu inclusive metas semanais de escrita).
contei pra ele que precisava de ajuda pra organizar uma lista de compras pra coisas pra casa e ele criou a lista pra mim. eu só encaixei no meu planejamento financeiro.
por fim, pedi pra ele também uma lista de atividades que eu posso fazer solo no fim de semana, pra ter à mão quando algum evento não acontecer.
eu poderia mesmo sentar e pensar em cada uma dessas coisas, mas é muito pra uma cabeça só. eu já preciso equilibrar mil pratinhos, e como uma pessoa extremamente ansiosa e que respira estrutura e rotina, ter essas listas me ajuda nos momentos de indecisão.
eu não sei você, mas eu fico absolutamente perdida quanto tenho um rolê com amigos que, de repente, é cancelado. o que eu faço nesse meio tempo? o meu padrão é fazer sempre a mesma coisa o tempo inteiro (sentar com um livro no sofá). mas tem muitas outras atividades que eu posso fazer e que podem, até mesmo, colaborar pra minha mente criativa.
o propósito das coisas é aquele que a gente dá. uma pá é só uma pá até que alguém decida que é uma arma. uma flor é só uma flor até que alguém decida que é uma declaração de amor e, aí, pode se tornar um bem valiosíssimo, mesmo que temporário.
é tudo significado e propósito. e, ainda bem, não tem ninguém dizendo pra mim que eu preciso colocar a inteligência artificial no meu lugar na hora de criar. vou deixar a tecnologia no lugar que lhe cabe, e nutrir a minha humanidade com o que me faz mais humana.
espero que você decida por isso também.
o que vai ser da gente que escreve, então? na verdade, ainda não tenho resposta. mas ao invés de me ocupar pensando no que vai vir a ser num futuro (não tão) distante, prefiro me forçar a concentrar no que tá acontecendo agora e em que base eu tô construindo a vida que eu quero viver.
tá ficando bonito.
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é isso por hoje.
se cuida e fica bem,